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Calçado português é competitivo em Espanha

terça-feira, 1 de setembro de 2009
Calçado português é competitivo em Espanha

Exportar para Espanha o calçado produzido em Portugal não é tarefa fácil. Face à forte concorrência regional do país, só se consegue ganhar vantagem competitiva com produtos diferenciadores e com uma boa relação de qualidade/ preço.
Esta é a opinião dos vários empresários participantes numa mesa-redonda sobre a Indústria do Calçado e o Mercado Espanhol, encontro promovido pela APICCAPS - Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes e Artigos de Pele e Seus Sucedâneos.
As empresas portuguesas presentes no mercado espanhol revelam experiências com sucesso relativo. A indústria de calçado espanhola tem produtores e marcas fortes.
O mercado está dividido em regiões muito diferentes em termos de gostos, rendimento per capita e sensibilidade ao preço (Madrid e a Galiza são as regiões mais conservadoras). Daí que seja difícil arranjar um distribuidor a nível nacional.
Além disso, as marcas podem ser envolvidas nas guerras entre agentes e distribuidores regionais - os distribuidores falam em mercado nacional mas não o controlam.
Por isso, é fundamental uma opção correcta na escolha das parcerias na distribuição (o que nem sempre terá acontecido com os participantes neste encontro da APPICAPS).
O forte peso da chamada economia paralela é uma prática muito arreigada neste mercado, mas que pode ser fatal - se não houver cuidados - para a implantação duma marca que preze a ética e a identidade.
Seja como for, os produtos portugueses vão ganhando vantagem competitiva (preço-qualidade-diferenciação) face aos espanhóis.
Entre os empresários representantes das marcas nacionais, há um optimismo muito moderado quanto ao crescimento das exportações para Espanha, mas consciência de que um mercado desta dimensão não pode ser desprezado.
Sector exposto à concorrência internacional
O sector de calçado português exporta 95% da produção. Por este motivo, Alfredo Jorge, director executivo da APICCAPS, considera que "é o sector da economia portuguesa mais exposto à concorrência internacional".
No entanto, "é o que apresenta o maior saldo da balança comercial (+ 800 milhões euros em 2008) e o que revela o melhor indicador de vantagem competitiva (saldo comercial/ exportações + importações)".
"Trata-se também de um sector que tem procurado assegurar competitividade em mercados diversos: Reino Unido e Escandinávia (1ª geração), França (2ª geração), Espanha e Japão (3ª geração)".
Relativamente à sua presença no mercado espanhol, "o crescimento das exportações acentuou-se a partir de 2002, até porque Espanha é um dos fortes produtores mundiais de calçado".
O testemunho das empresas
Participaram no debate da APICCAPS as empresas Dkode, representada por Vasco Sampaio, Eject (António Xavier);Yes (Luís Sá) e Comfortsystem (Orlando Santos).
"A nossa experiência de cinco anos revelou grandes dificuldades e constrangimentos, designadamente na distribuição. Trata-se de um mercado muito nacionalista, existindo ainda uma desconfiança dos espanhóis face a produtos e marcas portuguesas", afirma Orlando Santos.
"Trata-se de um mercado dividido em regiões, com agentes próprios e muitas vezes trabalhando de forma menos escrupulosa. Em Espanha, torna-se difícil haver um só distribuidor a nível nacional o que dificulta a implantação da marca", acrescenta o responsável da Omfortsystem.
"Hoje em dia a empresa faz vendas directas às lojas " captadas" nas principais Feiras do ramo."
Vasco Sampaio, da Dkode, salienta que Espanha é um mercado amplo (40 milhões de habitantes e 50 milhões turistas/ano) e que, por isso, "não pode ser desprezado".
O empresário aponta, no entanto, alguns constrangimentos significativos: "É um mercado dividido em pelo menos sete regiões com realidades diferentes em termos de gostos, rendimento per capita e sensibilidade ao preço. É um mercado com atitudes muito conservadoras, especialmente Madrid e Galiza. O preço médio do calçado espanhol é inferior ao português". E alerta para um isco: "Uma má opção na escolha dum distribuidor pois os mercados regionalizados induzem comportamentos pouco cuidados por parte dos agentes e distribuidores. Genericamente, é um mercado conservador, menos dada à irreverência e inovação. Um mercado onde não chega a imagem envelope de produto português e em que as produções e marcas próprias têm forte relevância".
"A Moda Calzado deixou de ser uma referência para o sector. A nossa estratégia visa uma crescente aproximação à área da moda, envolvendo-nos na sapataria boutique em detrimento da tradicional (razão pela qual abandonamos a Moda Calzado em Madrid)."
Distribuidores não controlam mercado espanhol
A perspectiva dos restantes participantes não é muito diferente.
"Estamos a largar a Moda Calzado - Madrid em detrimento de feiras no âmbito da moda/ estilismo, porque a estratégia que assumimos identifica-se com a sapataria-boutique", afirma António Xavier da Eject.
"Dentro de Espanha há uma grande diversidade de mercados, sendo complicado arranjar um distribuidor nacional (é um constrangimento). Com efeito, os distribuidores falam em mercado nacional mas não o controlam, porque procedem a subcontratações a agentes doutras regiões, menos pró-activos e escrupulosos. Há risco de uma marca ficar envolvida numa guerra entre agentes e/ou distribuidores regionais", afirma. "A existência de uma forte economia paralela cuja tradição é estrutural pode ser prejudicial para uma marca que se quer afirmar", conclui.
É o que pensa também Luís Sá: "Há vários mercados/regiões com diferentes sistemas de organização da distribuição, o que gera maior complexidade e menos controle do que noutros mercados.
 Orlando Santos - Comfortsystem

Espanha continua a perder muitos produtores e os produtos portugueses começam a oferecer uma melhor relação preço-qualidade.
Não acredito muito num aumento visível das exportações para Espanha. A nossa posição não é também de reduzir mas sim de manter.
O fundamental para o futuro é assegurar o respeito em Espanha pelas marcas portuguesas. A solução é estar em diversas feiras e pontos de venda. Devemos apostar em marcas próprias."

 Vasco Sampaio  - Dkode

"As nossas vendas para Espanha já foram melhores.
As perspectivas são mesmo de queda, até porque a nossa estratégia de aproximação à moda é mais consentânea com outros mercados.
No entanto, continuamos a dizer que globalmente a dimensão do mercado espanhol justifica que não o abandonemos. Tendo sido o mercado espanhol dos que mais caiu perante o impacto da crise global teremos que esperar pela respectiva retoma, que ninguém sabe quando será."

António Xavier - Eject

"No momento em que a produção espanhola de calçado está a decair penso que o sector português deu um efectivo salto em termos de design próprio e de qualidade que lhe pode proporcionar uma boa penetração em Espanha.
O mercado espanhol será um mercado mais de crescimento em qualidade(valor acrescentado) do que em quantidade. Dentro do mercado espanhol o País Basco e a Catalunha são as regiões com maiores potencialidades para o nosso calçado."

Luís Sá - Yes

Corroborando com boa parte das perspectivas traçadas pelas outras empresas participantes o representante da YES sintetizou dizendo: "Não haverá grandes hipóteses no mercado espanhol".
"Há distribuidores pouco sérios que podem encostar uma marca. Deparamo-nos também com um sistema de pagamentos muito latino e dificuldades - face aos indicadores de clientes - em obter seguros de crédito. O abuso da economia paralela, como sistema generalizado, pode prejudicar uma marca."

Alfredo  Jorge - APICCAPS

"Em 2008, o valor das exportações de calçado português atingiu 150 milhões euros. O mercado espanhol é o terceiro no ranking das exportações nacionais de calçado.
Em 2009, tem-se naturalmente sentido o impacto da crise global, onde as empresas melhor posicionadas vão tentar manter a sua competitividade e esperar pela retoma."
"O mercado espanhol do calçado apresenta grandes mutações e também características específicas e complexas".


Fonte: Vida Económica, 28.Ago.09
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