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O calçado português no Japão

segunda-feira, 7 de dezembro de 2020
Um mercado de oportunidades
O calçado português no Japão

A APICCAPS, em conjunto com a AICEP, organizou no dia 25 de novembro um webinar sobre o calçado português no Japão. A sessão, mediada por Isabel Gorjão, da AICEP, contou as intervenções de João Maia, diretor-geral da APICCAPS, Miguel Malheiro Garcia, diretor da delegação da AICEP em Tóquio, Tomoko Oya, jornalista e especialista no setor calçado japonês, Hiroshi Takahashi, presidente da importadora High Bridge International Co., Ltd, e Takahiro Noguchi, presidente da importadora Noguchihiko Co., Ltd.

O mercado japonês é o terceiro mais importante para o calçado nacional, a seguir ao Europeu e ao norte-americano. Partindo desta premissa, João Maia, diretor-geral da APICAPS, deu início ao webinar, recordando que há um ano a associação havia estabelecido como objectivo direcionar esforços para a promoção do calçado português no Japão. Para o efeito, deu-se início à preparação de uma viagem, para uma delegação forte e representativa do setor que, por força da propagação da COVID-19, foi adiada.

Face ao cenário de incerteza vigente, João Maia não deixou de salientar a importância deste webinar para a promoção do mercado japonês junto das empresas portuguesas, sublinhando a necessidade de melhor conhecê-lo, com vista ao estabelecimento de relações proveitosas entre as empresas nacionais e os importadores japoneses.

O papel da AICEP no Japão
Seguiu-se a intervenção do diretor da delegação da AICEP em Tóquio, Miguel Malheiro Garcia, que partilhou algum do conhecimento adquirido no terreno sobre o mercado e fatores de contexto relevantes.

Em primeiro lugar, frisou o peso da demografia no horizonte japonês, designadamente, o progressivo envelhecimento da população e a queda da taxa de natalidade, considerando que a longo prazo a internacionalização será vital para o desenvolvimento de alguns setores da economia e de pequenas e médias e empresas.

De seguida, Malheiro Garcia abordou a questão inevitável, ou seja, o cenário de incerteza provocado pela pandemia. Embora os números relacionados com a COVID se mostrem mais favoráveis que aqueles registados na Europa e nos Estados Unidos, o país não passará incólume. As entradas no Japão para a participação em eventos encontram-se altamente limitadas e a economia encolheu 5,3% ao longo de 2020. Com efeito, o governo nipónico prepara-se para lançar um terceiro pacote de estímulos e, de acordo com um estudo da Nikkei, os CEO japoneses preveem um período de dois anos para a retoma económica.

Já a terceira parte da sua intervenção voltou-se para alguns traços essenciais da cultura negocial nipónica, nomeadamente, a necessidade de uma preparação prévia sólida antes da entrada no Japão, atenta também aos aspetos formais. O diretor da delegação da AICEP salientou, ainda, as diferenças existentes no modo de atuação das empresas ocidentais e japonesas. As empresas portugueses que desejem entrar no mercado japonês devem ter em mente que o processo de tomada de decisão no Japão é moroso, pois as propostas passam por todos os envolvidos, de baixo para cima, tendo em vista a redução de eventuais surpresas e a partilha do conhecimento tácito.

Não obstante, ressalvou que, depois, o processo de implementação é mais rápido do que aquele a que estamos usualmente habituados. Constata-se, portanto, a predominância de uma visão holística, voltada para o processo, e não exclusivamente alavancada em números e objetivos. No Japão “nenhum problema é um problema”, o que deixa uma margem significativa para uma contínua melhoria.

Por fim, o diretor da delegação da AICEP em Tóquio mostrou-se disponível para apoiar as empresas portuguesas interessadas no mercado japonês, colocando à disposição todo o conhecimento acumulado pela delegação no terreno. Esta disponibilidade é ainda mais relevante face ao cenário de incerteza que a economia enfrenta, hoje, e à necessidade de encontrar novas estratégias para enfrentar desafios inimaginados há pouco mais de um ano.

O setor do calçado no Japão
A jornalista, e especialista no setor, Tomoko Oya, contribuiu com uma apresentação detalhada sobre o tamanho do mercado, tendências e o espaço ocupado e potencial do calçado nacional no Japão.

Em 2019, o comércio de calçado, no Japão, totalizou um valor de 1350 biliões de yen, sendo que 48% deste valor resulta da comercialização de calçado desportivo. Contudo, introduzindo o aspeto demográfico (também salientado por Miguel Malheiro Garcia), observam-se novas tendências, ainda que tímidas. Por exemplo, o comércio de calçado infantil (7%) tem vindo a aumentar, fruto do aumento de famílias com menos crianças, o que gera uma maior disponibilidade financeira por parte da família nuclear e afastada. É expectável, no entanto, que em 2030 o mercado de calçado diminua para os 1200 biliões de yen, devido à diminuição da população.

Outra característica fundamental do mercado japonês é a forte dependência em relação aos mercados externos: mais de 90% do calçado comercializado no país é importado. A China é, neste contexto, o maior exportador, quer em valor, quer em quantidade, e assiste-se a um aumento do peso das importações com origem no Vietname. Em relação a calçado de origem europeia, Itália, Espanha e Portugal totalizam, em conjunto, um total de 25% em relação a calçado de pele ou com partes de pele, sendo que a percentagem total de calçado europeu importado é muito inferior.

Olhando especificamente ao preço médio das importações, fica patente que o calçado mais barato provém dos “vizinhos asiáticos” e o calçado mais caro, associado a marcas de luxo, da Europa, especialmente o italiano. Ainda que abaixo de Itália, Portugal distingue-se de Espanha por praticar um preço médio superior.

Neste sentido, Tomoko Oya aconselha as empresas portuguesas a apostarem em valor acrescentado, designadamente funcionalidade, conforto e bem-estar, e recorda duas mais-valias da indústria nacional, a cortiça e o know-how na produção. Embora considere que as feiras internacionais não têm o mesmo impacto de há alguns anos, não deixa de as ver como uma estratégia válida para comunicar com potenciais clientes, pelo que recomenda a participação em certames como a Fashion World Tokyo ou a Project Tokyo, ou mesmo a produção de uma exibição em nome próprio, à semelhança das já existentes ‘Shoes from Spain’ e ‘Shoes from Italy’. Sugere, ainda, que a entrada no mercado japonês pode ser facilitada pelo estabelecimento de parcerias com empresas nipónicas.

Por fim, recordou que, em Fevereiro de 2019, entrou em vigor o Acordo de Parceria Económica entre o Japão e a União Europeia (EPA), o maior acordo comercial alguma vez assinado entre ambas as regiões. De acordo com este, a tarifa de importação imposta pelo Japão será abolida em 10 anos, ou seja, em 2029, sendo progressivamente diminuída até lá. Apesar do prazo alargado, este acordo apresenta-se como uma oportunidade para o calçado português.

A experiência de importadores de calçado português
Hiroshi Takahashi é o presidente da High Bridge International Co., que importa calçado português há cerca de 25 anos. No entanto, alerta que têm existido dificuldades na relação com as empresas portuguesas devido a fatores como o preço, à diferença entre os mercados europeu e japonês e à distância, que tende a dificultar a entrega atempada dos produtos (atraso que se acentuou com o contexto pandémico).
Para ultrapassar as dificuldades, Takahashi sugere às empresas portuguesas que intensifiquem a aposta na inovação e no estabelecimento de contratos OEM (Original Equipament Manufacturer), ou seja, produção de componentes/produtos para empresas que respondem a solicitações específicas (design, preço, matérias-primas, local de origem, etc.) dos consumidores finais.
Também Takahiro Noguchi, presidente da Noguchihiko, é da mesma opinião, sublinhando inclusive o know-how da produção, aliada a matérias-primas de qualidade, como a pele e a cortiça, que não pode ser encontrado nos parceiros asiáticos mais próximos. Recordando, ainda, a janela de oportunidade que se abre com o acordo de Parceria Económica entre o Japão e a União Europeia, Noguchi apela ao preenchimento correto do formulário de produto de origem e do recibo.

Última palavra
Em jeito de conclusão, os intervenientes nipónicos parecem associar o calçado português à imagem de casualidade e funcionalidade. Neste sentido, e atendendo a uma previsível alteração no estilo de vida na era ‘pós-covid’, que deverá privilegiar o bem-estar e a sustentabilidade, Tomoko Oya deixa uma recomendação final: uma aposta na produção de calçado confortável, funcional e desportivo.

Fonte: APICCAPS
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